Autor:
Messias Torres (Pedagogo)
Nas minhas muitas ‘andanças’
pelo município de Antônio Martins/RN, especialmente em Comunidades da zona
rural, seja como Técnico/entrevistador do Cadastro Único para Programas Sociais
– CadÚnico, seja por outras ocasiões, aprendi sob aspectos diversos - como assim
não poderia deixar de ser - e fiz, neste percurso, algumas constatações, sobre
as quais pretendo, em sucinto, a seguir, discorrer. Constituem, portanto, o
resultado não terminativo de um “observador”, neste caso, comprometido
estritamente com o objeto de sua observação e com os pormenores (humanos,
históricos, culturais, etc.) que o configura. Sem tantas surpresas, as considerações
doravante comentadas foram conseguidas ora espontaneamente, ora, sobretudo, à
luz de uma perspicácia e curiosidade inevitáveis a quem toma contato humano no
“corpo a corpo”, numa espécie de “empiria” necessariamente sentida. Daí uma
abundância de significados resultantes de tal experiência, da qual se encaminha
esta exígua reflexão pessoal e, máxime, pedagógica.
Em principio, impera
dizer de carências e dificuldades ainda defrontadas por esse quase uniforme
segmento social (moradores dos sítios e também da cidade); carências estas caracterizadas
desde as necessidades ditas assim mais primitivas, tais como o direito a uma ambiência
salutar - tanto do ponto vista físico, como psicológico-existencial - até os insumos
basilares para uma vida digna, na plenitude do termo. Contudo, transcorridos esses
quesitos (é claro, com a sua relevância), o que, a meu ver, é mais
sobressalente em todo o contexto percebido são as condições educacionais existenciais,
que, por sua vez, em maior ou menor intensidade, determinam o quadro sociológico
do público em questão.
É manifesto nas
pequenas falas, nos pequenos diálogos entrecortados, nos silêncios, nos
olhares... desses indivíduos, mesmo quando subliminares, mensagens do tipo:
“não tem jeito”; “é impossível mudar”; “só Deus pra resolver” ou, “nasci assim,
vou morrer assim” e tantos outros congêneres já conhecidos - social e
humanamente perniciosos. Sabe-se que isso tem suas explicações nos séculos de
indiferença governamental, nas diversas formas de exclusão perversa e em fim
nos próprios vieses da conformação histórico-social da nossa sociedade. Como conseqüência,
não só opulência x miséria, privilégio x exclusão e estratificação de classes,
dentre outros “ingredientes”, mas, como um fator, em certa medida, decisivo, resulta
disso tudo: a negativação da auto-estima e da auto-imagem do individuo
marginalizado, então, estigmatizado no desenvolvimento de suas potencialidades
e na sua vida como um todo.
Que dificuldades são um
fato, isto não se questiona. Para todos os efeitos, não se justificaria, porém,
“negligenciar” a si mesmo e sucumbir face ao papel que os compete, pela via do
negativismo e do derrotismo não questionados. Por isso, a demanda para mudanças
sociais significativas consiste substancialmente, também, em estimular as
consciências.
Em última análise, não
há, a priori, uma consciência individual-coletiva motivada e ao mesmo tempo,
geradora de motivações. Faltam, portanto, (do ponto de vista do grupo em
análise) motivos afincados justificadores de um pensar e, por conseguinte, de um
agir plenamente transformador desses indivíduos, como dito, em sua história,
estigmatizados.
É fundamental, pois, influenciar
nesta matéria. Como? Educando-se! (Vale dizer, educando-se numa relação de absoluta
reciprocidade).
Não se pretenderia aqui
falar-se de “mal-educação”. Absolutamente. Aliás, digo, eu, de uma marca
caracterizante do nosso povo, a citar, a receptividade incondicional e a singeleza,
igualmente contidas na bravura e na esperança perpétua que os afirmam como gente
de bem, acima de tudo.
O problema fulcral,
pelas explicitações inequivocamente observáveis e conforme penso, não mais está
concentrado na falta de acesso a bens de subsistência, como um determinante, igual
visto há algumas décadas, (embora havendo certas limitações, entretanto, aos
poucos sendo superadas).
Na qualidade de
Pedagogo, prefiro situar o cerne de problemáticas sociais responsáveis por
severos impactos em nossa população, como é o caso do fator miserabilidade, na
temática educação. É óbvio que em se tratando de públicos não ou quase
não-escolarizados e em faixa etária defasada daquela entendia “normal” para
escolarização, é mais viável e coerente falar-se de uma concepção mais
pragmática e, por assim dizer, diferenciada de educação. Ressalta-se, a propósito,
que educar(se) não se confunde com escola, ‘livro’ ou algo do tipo, simplesmente.
A educação de que trato
aqui corresponderia, então, a ressignificar (por eles mesmos) a vida dos sujeitos
em causa; de modo que educar tais sujeitos deve ter um sentido sobremaneira
prático e factível, quer dizer, educá-los de tal forma para aplicação imediata do
aprendizado no dia a dia, no desempenho das atividades que lhes são próprias à subsistência.
Pois bem, a tona de tais
constatações requer o delineamento de alguns elementos, no mínimo, descritivos.
Sendo assim, ao definir situações gerais, apresento uma pequena exemplificação
do que seja educar-se a esta população com base nos pressupostos ora referenciados,
quais sejam:
a)
Educar-se para o saneamento básico doméstico e para as questões de higiene em
geral;
b)
Educar-se para as relações de cooperação comunitária e para a ação na
coletividade;
c)
Educar-se para a produção, seleção, conservação e uso alimentar adequados;
d)
Educar-se para a prática de atividades produtivas rurais auto-sustentáveis;
e)
Educar-se para a inserção de “tecnologias sociais” alternativas;
f) Educar-se
para o valor inestimável que tem o “educar-se” em todos os âmbitos; e
g) “Educar-se, em fim, para a vida toda”...
Em outras palavras, refiro-me
a potencializar a dignidade para fazer jus à condição primaz de ser humano
caracterizado para consigo mesmo e para a sociedade, a fim de transformá-lo em
agente de transformações da sua Comunidade e de seu próprio mundo.
Logo, as conclusões a
que chego, me permitem, assim, ponderar: mais do que “benefícios de governos”;
mais do que “feijão e arroz” e, numa palavra, mais do que “coisas limitadamente
materiais”, o povo é carente de saber!
Saber por que, pra quê e como fazer para se viver melhor.
Por esta razão é que,
irremediavelmente - a qualquer tempo - necessita-se e clama-se por educação/conhecimento,
sem o que apenas se sobrevive; e, parafraseando um poeta, isso quando, ao
contrário, não se morre por antecipação um pouco a cada dia. - Pensemos
nisso...
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