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14-05-2012 *APRENDENDO A CONVIVER COM A SECA


A Professora emérita da UFRN, Terezinha de Queiroz Aranha, uma das estudiosas sobre o tema Seca, fala com conhecimento profundo sobre o tema e critíca ações que não se complementam. Ela vislumbra o cenário ainda pior.

Planos e propostas foram muitos, alguns elaborados já no fim da segunda metade do século XIX e, agora, já no começo do século XXI, estudiosos do fenômeno natural da seca convergem para uma mesma opinião: convivência.

Alex Régis
Abastecimento com carro-pipa ainda é uma realidade no Estado

Aos 83 anos, a professora emérita da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Terezinha de Queiroz Aranha,  continua sem abrir mão de suas ideias, construídas ao longo dos anos de estudo sobre a seca, que começou a vivenciar na tenra idade, quando ouviu falar da carta que o avô Manoel Avelino dos Santos mandou para Getúlio Vargas, nos anos 40,  pedindo que não construísse a barragem da Oiticica, em Jucurutu, "porque iria expulsar os pequenos agricultores de suas terras". Já nos anos 50 passou a ter interesse no assunto: "O primeiro saque que vi, meu pai, Francisco Alves de Queiroz, era prefeito de Pendências", lembra.

Décadas se passaram e a barragem da Oiticica ainda é um projeto que não saiu do papel e dos escaninhos palacianos. Apesar de órgãos criados exclusivamente para desenvolver o semiárido nordestino, como o Dnocs e a Sudene, segundo ela, "falta vontade política" para implementação das ações de "convivência" e não de "combate à seca", como durante anos se convencionou chamar as diretrizes públicas para minimizar os prejuízos econômicos e sociais causados por esse fenômeno natural: "Tenho esperança de que um dia não se veja mais água distribuída por carro-pipa".

"A seca é uma moeda de duas faces, político e climático", asseverou Terezinha Queiroz, que critica a "descontinuidade" e "falta de planejamento" das ações públicas, da mesma forma que nos anos 80 posicionou-se contra as obras da barragem Armando Ribeiro Gonçalves, no Vale do Açu, porque estava sendo construída sobre uma falha geológica.

Agora, ela acha desnecessária a construção da barragem da Oiticica, porque só vai aumentar o volume da barragem  Armando Ribeiro Gonçalves, cuja capacidade de armazenamento é de R$ 2,6 bilhões de metros cúbicos de água, mas que em período chuvoso, com a abertura das comportas, alaga as terras agricultáveis do Baixo-Açu: "Quando vem água demais a barragem dá prejuízo, nunca vi uma coisa tão contraditória", avalia.

Como as ações governamentais "não se complementam e não se realizam", a professora Terezinha Queiroz, que foi fundadora e hoje é consultora do Núcleo Temático da Seca (Nut-seca) da UFRN, acha que a tendência dos problemas causados nos períodos de seca tendem  a piorar, em virtude do agravamento das condições climáticas e ambientais por causa da destruição da camada de ozônio na atmosfera, que protege o planeta das irradiações solares.

Ela lamenta que professores universitários não tenham  se debruçado mais constantemente sobre os estudos da seca, que nos anos de maior atuação do Nut-seca envolvia mais equipes multidisciplinares. Terezinha Queiroz até sugere que a área de extensão universitária da UFRN podia escolher um determinado município para executar um projeto piloto de pesquisa sobre a seca e daí tirar ações exitosas que pudessem ser levados para outros municípios do semiárido do Rio Grande do Norte, que hoje conta com 139 municípios com a situação de emergência reconhecida pelo governo federal.

Terezinha Queiroz ainda lamenta que  não tenha vingado, por exemplo, o "Projeto Rio Grande do Norte", que só gerou, dentro da UFRN, o estudo "A Problemática da Seca no RN", que resultou na experiência do Nut-Seca, o qual, chegou a dizer em 2005, já estava com a sua energia adormecida.

"Talvez pouca gente acredite no imenso potencial de informação existente em suas estantes, suas caixas e seus arquivos", afirmara ela, na época, a respeito de um material que "assegura o estudo da seca nos aspectos climáticos, legais, políticos, contábeis, econômicos, administrativos, artísticos, culturais e ambientais".

Políticas precisam de continuidade

"As coisas sempre são feitas de improviso e ficam na situação de emergência", é como o diácono Francisco das Chagas Teixeira de Araújo, 50 anos, avalia o tratamento que é dado pelo poder público à problemática da estiagem e às consequências, sobretudo, para o pequeno agricultor.

O diácono Francisco Araújo é Coordenador do Serviço de Apoio aos Projetos Alternativos Comunitários (Seapac), ligado à Arquidiocese de Natal, e diz que não é por falta de planos que as ações deixam de ocorrer na região semiárida do Rio Grande do Norte e da região Nordeste. Agora mesmo, no dia 17 de abril, o Fórum do Campo Caicoense voltou a discutir soluções para as dificuldades que as comunidades rurais estão enfrentando para conviver com o fenômeno natural da seca em 2012.

"Nós temos que descartar o velho paradigma de combate à seca, esse é o maior desserviço que a gente pode prestar na compreensão e formação de uma cultura nova em relação à seca no Nordeste", disse ele, para quem a convivência com o  semiárido, "esse é o novo, desenvolver a cultura que necessitamos estar em estado permanente de convivência, porque as obras de infraestruturas hídricas não devem ser feitas apenas na seca, mas na época do inverno".

No documento, pelo menos cinco instituições envolvidas com a questão do homem do campo, chegaram à seguinte conclusão: "A fome e a sede no semiárido não têm nada de natural, é uma criação, um produto humano, social e político".

Teixeira também disse que houve a criação de um Fundo Estadual para a convivência com a seca, "mas vejam quantos centavos têm hoje nesse Fundo". Agora, continua ele, fica tudo "nesse estado de emergência e improvisação, cada um atirando para uma direção".

Ainda diz o documento, que há ausência de água no semiárido, "e sim a concentração e má distribuição, porém, a seca, sim, é um fenômeno natural no qual precisamos saber conviver e não combatê-la".
Ele alerta que se fizeram diversos programas de Desenvolvimento Regional, mas depois "eles ficaram nas prateleiras", como os da região do Seridó, Trairi e Oeste, construídos com a sociedade.

Francisco Teixeira enfatiza que este ano é o pior período de chuvas desde a seca de 1993, quando, em Recife (PE) tirou-se o documento "Ações Permanentes para o Desenvolvimento do Nordeste/Semiárido Brasileiro", como uma proposta da sociedade civil. A construção de 1 milhão de cisternas, como se propôs e anunciou o governo de então, parou pelo caminho.

Teixeira conta, com base no documento elaborado em Caicó, que depois de oito anos sucessivos de inverno, simplesmente abandonaram a recuperação de açudes que romperam, não instalaram e nem fizeram manutenção de poços e dessalinizadores e pararam com os programas de obras hídricas e comunitárias.

Para Teixeira, inexiste uma política pública permanente, que ele acha imprescindível para reduzir os efeitos do fenômeno sazonal da estiagem. Já no caso específico do Rio Grande do Norte, ele disse que existe um programa com "uma configuração de política pública", que é a distribuição de leite às famílias carentes, cuja matriz a partir de meados dos anos 80, tinha a finalidade de incentivar a agropecuária leiteira e reduzir os índices de desnutrição na região Nordeste, pois o programa foi criado pelo governo federal e, depois, encampado pelo governo estadual.

Além disso, Teixeira considera como um projeto importante de política pública, a construção de adutoras, que foi interrompido, como também elogia o formato que passou a ter, a partir dos anos 90, o programa financiado pelo Banco Mundial para o combate à pobreza no meio rural.

Segundo Teixeira, até o começo dos anos 90, de acordo com estudos feitos pelo Banco Mundial, de cada R$ 100,00 aplicados, no máximo chegavam R$ 10,00 à ponta do beneficiário, o agricultor.

Para ele, a coisa começou a mudar depois do primeiro governo Garibaldi Filho (1995/998), quando houve a decisão que ao invés dos recursos serem geridos diretamente pelo Estado, passou a ser gerido por um conselho estadual e pelos conselhos municipais, incentivando o associativismo, com o chamado Fumac.

Ações como essas, admitiu Teixeira, permitem que na seca deste ano, a situação na zona rural não seja tão dramática quanto era há décadas, quando as ações governamentais eram, acentuadamente, mais assistencialistas e paternalistas.

Fundo deveria contar com mais recursos próprios

O Fundo Estadual de Enfrentamento da Seca tem uma dotação orçamentária original de R$ 2.678.000, o que representa apenas 0.03% no Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2012, que é de R$ 9,40 bilhões.

Mesmo constando do orçamento geral da Secretaria Estadual da Agricultura, da Pecuária e da Pesca (Sape), "a posição do Fundo é pouco considerável", segundo o deputado estadual Fernando Mineiro (PT).

Segundo o deputado, a maior parte do recurso orçamentário é proveniente de convênios e das contrapartidas do governo estadual. De recursos próprios são R$ 500 mil ou 18,7% dos recursos financeiros previstos.

"Há, portanto, uma forte dependência da viabilização de convênios, da ordem de R$ 1,98 milhão ou 74% aproximadamente do total, para os quais o orçamento garante contraparida de R$ 198 mil", diz o parlamentar. Com a soma dos recursos ordinários, segundo ele, chega-se a 26,1% de aporte estadual para a implementação do Fundo de Enfrentamento da Seca.

O deputado frisa que, certamente, existem distribuídos no OGE 2012, outras atividades e projetos que contribuem para amenizar os efeitos das longas estiagens, como, por exemplo, o projeto do Fundo de Desenvolvimento Agropecuário da SAPE, que prevê R$ 1,4 milhão para a construção de cisternas de placas: "Mas é o Fundo da Seca que destina, objetivamente, ao enfrentamento das situações como as que passam, agora, 139 dos municípios".

Para o parlamentar, a crise no campo só não está maior "porque existe, hoje, uma rede de proteção social muito forte", embora ache que ações nas três esferas de governo  não são efetivadas de forma permanente.

Valdir Julião – repórter

*Enviado por Gualberto César


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