A Professora emérita da UFRN, Terezinha de
Queiroz Aranha, uma das estudiosas sobre o tema Seca, fala com conhecimento
profundo sobre o tema e critíca ações que não se complementam. Ela vislumbra o
cenário ainda pior.
Planos e propostas foram muitos, alguns
elaborados já no fim da segunda metade do século XIX e, agora, já no começo do
século XXI, estudiosos do fenômeno natural da seca convergem para uma mesma
opinião: convivência.
Alex Régis
Abastecimento com carro-pipa ainda é uma
realidade no Estado
Aos 83 anos, a professora emérita da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Terezinha de Queiroz Aranha, continua sem abrir mão de suas ideias, construídas ao longo dos anos de estudo sobre a seca, que começou a vivenciar na tenra idade, quando ouviu falar da carta que o avô Manoel Avelino dos Santos mandou para Getúlio Vargas, nos anos 40, pedindo que não construísse a barragem da Oiticica, em Jucurutu, "porque iria expulsar os pequenos agricultores de suas terras". Já nos anos 50 passou a ter interesse no assunto: "O primeiro saque que vi, meu pai, Francisco Alves de Queiroz, era prefeito de Pendências", lembra.
Décadas se passaram e a barragem da Oiticica ainda é um projeto que não saiu do papel e dos escaninhos palacianos. Apesar de órgãos criados exclusivamente para desenvolver o semiárido nordestino, como o Dnocs e a Sudene, segundo ela, "falta vontade política" para implementação das ações de "convivência" e não de "combate à seca", como durante anos se convencionou chamar as diretrizes públicas para minimizar os prejuízos econômicos e sociais causados por esse fenômeno natural: "Tenho esperança de que um dia não se veja mais água distribuída por carro-pipa".
"A seca é uma moeda de duas faces, político
e climático", asseverou Terezinha Queiroz, que critica a
"descontinuidade" e "falta de planejamento" das ações
públicas, da mesma forma que nos anos 80 posicionou-se contra as obras da
barragem Armando Ribeiro Gonçalves, no Vale do Açu, porque estava sendo
construída sobre uma falha geológica.
Agora, ela acha desnecessária a construção da
barragem da Oiticica, porque só vai aumentar o volume da barragem Armando
Ribeiro Gonçalves, cuja capacidade de armazenamento é de R$ 2,6 bilhões de
metros cúbicos de água, mas que em período chuvoso, com a abertura das
comportas, alaga as terras agricultáveis do Baixo-Açu: "Quando vem água
demais a barragem dá prejuízo, nunca vi uma coisa tão contraditória",
avalia.
Como as ações governamentais "não se
complementam e não se realizam", a professora Terezinha Queiroz, que foi
fundadora e hoje é consultora do Núcleo Temático da Seca (Nut-seca) da UFRN,
acha que a tendência dos problemas causados nos períodos de seca tendem a
piorar, em virtude do agravamento das condições climáticas e ambientais por
causa da destruição da camada de ozônio na atmosfera, que protege o planeta das
irradiações solares.
Ela lamenta que professores universitários não tenham
se debruçado mais constantemente sobre os estudos da seca, que nos anos de
maior atuação do Nut-seca envolvia mais equipes multidisciplinares. Terezinha
Queiroz até sugere que a área de extensão universitária da UFRN podia escolher
um determinado município para executar um projeto piloto de pesquisa sobre a
seca e daí tirar ações exitosas que pudessem ser levados para outros municípios
do semiárido do Rio Grande do Norte, que hoje conta com 139 municípios com a
situação de emergência reconhecida pelo governo federal.
Terezinha Queiroz ainda lamenta que não
tenha vingado, por exemplo, o "Projeto Rio Grande do Norte", que só
gerou, dentro da UFRN, o estudo "A Problemática da Seca no RN", que
resultou na experiência do Nut-Seca, o qual, chegou a dizer em 2005, já estava
com a sua energia adormecida.
"Talvez pouca gente acredite no imenso
potencial de informação existente em suas estantes, suas caixas e seus
arquivos", afirmara ela, na época, a respeito de um material que
"assegura o estudo da seca nos aspectos climáticos, legais, políticos,
contábeis, econômicos, administrativos, artísticos, culturais e
ambientais".
Políticas
precisam de continuidade
"As coisas sempre são feitas de improviso e
ficam na situação de emergência", é como o diácono Francisco das Chagas
Teixeira de Araújo, 50 anos, avalia o tratamento que é dado pelo poder público
à problemática da estiagem e às consequências, sobretudo, para o pequeno
agricultor.
O diácono Francisco Araújo é Coordenador do Serviço de Apoio aos Projetos Alternativos Comunitários (Seapac), ligado à Arquidiocese de Natal, e diz que não é por falta de planos que as ações deixam de ocorrer na região semiárida do Rio Grande do Norte e da região Nordeste. Agora mesmo, no dia 17 de abril, o Fórum do Campo Caicoense voltou a discutir soluções para as dificuldades que as comunidades rurais estão enfrentando para conviver com o fenômeno natural da seca em 2012.
O diácono Francisco Araújo é Coordenador do Serviço de Apoio aos Projetos Alternativos Comunitários (Seapac), ligado à Arquidiocese de Natal, e diz que não é por falta de planos que as ações deixam de ocorrer na região semiárida do Rio Grande do Norte e da região Nordeste. Agora mesmo, no dia 17 de abril, o Fórum do Campo Caicoense voltou a discutir soluções para as dificuldades que as comunidades rurais estão enfrentando para conviver com o fenômeno natural da seca em 2012.
"Nós temos que descartar o velho paradigma
de combate à seca, esse é o maior desserviço que a gente pode prestar na
compreensão e formação de uma cultura nova em relação à seca no Nordeste",
disse ele, para quem a convivência com o semiárido, "esse é o novo,
desenvolver a cultura que necessitamos estar em estado permanente de
convivência, porque as obras de infraestruturas hídricas não devem ser feitas
apenas na seca, mas na época do inverno".
No documento, pelo menos cinco instituições
envolvidas com a questão do homem do campo, chegaram à seguinte conclusão:
"A fome e a sede no semiárido não têm nada de natural, é uma criação, um
produto humano, social e político".
Teixeira também disse que houve a criação de um
Fundo Estadual para a convivência com a seca, "mas vejam quantos centavos
têm hoje nesse Fundo". Agora, continua ele, fica tudo "nesse estado
de emergência e improvisação, cada um atirando para uma direção".
Ainda diz o documento, que há ausência de água
no semiárido, "e sim a concentração e má distribuição, porém, a seca, sim,
é um fenômeno natural no qual precisamos saber conviver e não combatê-la".
Ele alerta que se fizeram diversos programas de
Desenvolvimento Regional, mas depois "eles ficaram nas prateleiras",
como os da região do Seridó, Trairi e Oeste, construídos com a sociedade.
Francisco Teixeira enfatiza que este ano é o
pior período de chuvas desde a seca de 1993, quando, em Recife (PE) tirou-se o
documento "Ações Permanentes para o Desenvolvimento do Nordeste/Semiárido
Brasileiro", como uma proposta da sociedade civil. A construção de 1
milhão de cisternas, como se propôs e anunciou o governo de então, parou pelo
caminho.
Teixeira conta, com base no documento elaborado
em Caicó, que depois de oito anos sucessivos de inverno, simplesmente
abandonaram a recuperação de açudes que romperam, não instalaram e nem fizeram
manutenção de poços e dessalinizadores e pararam com os programas de obras
hídricas e comunitárias.
Para Teixeira, inexiste uma política pública
permanente, que ele acha imprescindível para reduzir os efeitos do fenômeno
sazonal da estiagem. Já no caso específico do Rio Grande do Norte, ele disse
que existe um programa com "uma configuração de política pública",
que é a distribuição de leite às famílias carentes, cuja matriz a partir de
meados dos anos 80, tinha a finalidade de incentivar a agropecuária leiteira e
reduzir os índices de desnutrição na região Nordeste, pois o programa foi
criado pelo governo federal e, depois, encampado pelo governo estadual.
Além disso, Teixeira considera como um projeto
importante de política pública, a construção de adutoras, que foi interrompido,
como também elogia o formato que passou a ter, a partir dos anos 90, o programa
financiado pelo Banco Mundial para o combate à pobreza no meio rural.
Segundo Teixeira, até o começo dos anos 90, de
acordo com estudos feitos pelo Banco Mundial, de cada R$ 100,00 aplicados, no
máximo chegavam R$ 10,00 à ponta do beneficiário, o agricultor.
Para ele, a coisa começou a mudar depois do
primeiro governo Garibaldi Filho (1995/998), quando houve a decisão que ao
invés dos recursos serem geridos diretamente pelo Estado, passou a ser gerido
por um conselho estadual e pelos conselhos municipais, incentivando o associativismo,
com o chamado Fumac.
Ações como essas, admitiu Teixeira, permitem que
na seca deste ano, a situação na zona rural não seja tão dramática quanto era
há décadas, quando as ações governamentais eram, acentuadamente, mais assistencialistas
e paternalistas.
Fundo
deveria contar com mais recursos próprios
O Fundo Estadual de Enfrentamento da Seca tem
uma dotação orçamentária original de R$ 2.678.000, o que representa apenas
0.03% no Orçamento Geral do Estado (OGE) para 2012, que é de R$ 9,40 bilhões.
Mesmo constando do orçamento geral da Secretaria
Estadual da Agricultura, da Pecuária e da Pesca (Sape), "a posição do
Fundo é pouco considerável", segundo o deputado estadual Fernando Mineiro
(PT).
Segundo o deputado, a maior parte do recurso
orçamentário é proveniente de convênios e das contrapartidas do governo
estadual. De recursos próprios são R$ 500 mil ou 18,7% dos recursos financeiros
previstos.
"Há, portanto, uma forte dependência da
viabilização de convênios, da ordem de R$ 1,98 milhão ou 74% aproximadamente do
total, para os quais o orçamento garante contraparida de R$ 198 mil", diz
o parlamentar. Com a soma dos recursos ordinários, segundo ele, chega-se a
26,1% de aporte estadual para a implementação do Fundo de Enfrentamento da
Seca.
O deputado frisa que, certamente, existem
distribuídos no OGE 2012, outras atividades e projetos que contribuem para
amenizar os efeitos das longas estiagens, como, por exemplo, o projeto do Fundo
de Desenvolvimento Agropecuário da SAPE, que prevê R$ 1,4 milhão para a
construção de cisternas de placas: "Mas é o Fundo da Seca que destina,
objetivamente, ao enfrentamento das situações como as que passam, agora, 139
dos municípios".
Para o parlamentar, a crise no campo só não está
maior "porque existe, hoje, uma rede de proteção social muito forte",
embora ache que ações nas três esferas de governo não são efetivadas de
forma permanente.
Valdir
Julião – repórter
*Enviado por Gualberto César
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