Elas se odeiam há mais de 30
anos, e pelo menos cem pessoas já foram mortas. Muitas vezes, os assassinos são
pistoleiros de aluguel. Guerra de Sangue entre famílias paraibanas é destaque
no Fantástico.
A reportagem é de Maurício
Ferraz e Alberto dos Santos.
Um assassinato durante o dia,
no meio da rua. A vítima é Aldo Suassuna, um preso em regime semiaberto. A
data: 25 de junho passado. Para a polícia, esse é o crime mais recente de uma
rivalidade sangrenta: cerca de cem mortos nos últimos 30 anos. Só agora, em
2011, foram pelo menos 15 assassinatos.
A guerra que se concentra na
região de Catolé do Rocha, no sertão paraibano, envolve duas famílias
tradicionais: os Suassuna e os Batista Mesquita, conhecidos na região como
família Oliveira. No começo, a briga era por questões políticas.
"O motivo, hoje, não é
poder, não é dinheiro. É só vingança pessoal. Você matou meu pai, eu vou matar
seu filho", explica o delegado regional André Rabelo.
Por causa dessa guerra de
famílias, 21 pessoas foram presas neste ano na operação policial Laços de
sangue. Entre os detidos, estava Marcelo Oliveira, suspeito de ser um dos
mandantes do assassinato de Aldo Suassuna. Marcelo tinha dois irmãos. Os dois
foram assassinados.
Em um depoimento à polícia,
obtido com exclusividade pelo Fantástico, Marcelo confessa um homicídio e
confirma a guerra entre os Oliveira e os Suassuna.
"O primeiro que eu perdi
foi meu pai e meu tio. Aí começaram a matar meus irmãos, meus primos",
afirma Marcelo.
-Aí teve que ser trocado?
"Que nem naquele ditado:
se correr o bicho pega, se ficar o bicho come".
Depois que prestou depoimento,
Marcelo Oliveira foi para um presídio de segurança máxima. Mas ficou menos de
12 horas preso. Ele foi encontrado morto e queimado. A polícia suspeita que
Marcelo tenha sido mais um alvo dessa guerra no sertão paraibano.
Quem não tem dúvida disso são
as irmãs de Marcelo, que também foram presas na época da operação Laços de
Sangue. Segundo as investigações, as irmãs Cleide e Nalva são as chefes da
família Oliveira. Ao ser presa, Cleide estava com um revólver.
Na outra família, diz a
polícia, quem manda é Humberto Suassuna. Ele não tem porte de arma, mas também
estava com uma pistola quando foi preso. Nalva, Cleide e Humberto estão na
cadeia, aguardando o julgamento.
O delegado regional Cristiano
Jacques conta: "As famílias se reuniam, contratavam pistoleiros.
Geralmente eram pessoas que eram ex-presidiários ou presidiários que estavam no
regime semiaberto".
E parte do dinheiro para pagar
os pistoleiros vinha de uma fonte inusitada, diz o delegado: "As famílias
colocavam os seus integrantes no seguro de vida, já que se houvesse a morte de
alguns, esse dinheiro era utilizado para financiar a morte como vingança
daquela pessoa que foi perdida pela família".
De acordo com as investigações,
outra parte do dinheiro para bancar os assassinatos vinha de parentes que se
mudaram para São Paulo. No estado paulista, cinco pessoas estão com prisão
decretada e são consideradas foragidas da Justiça. Entre elas, Geneton
Oliveira, réu em vários processos de homicídios. Segundo a polícia, mesmo
morando em São Paulo, ele ordenava e financiava parte das mortes.
Para o procurador-geral de
Justiça da Paraíba Oswaldo Trigueiro, Geneton Oliveira conta hoje com proteção
ilegal de policiais paulistas. "Esse esquema envolve realmente na
liderança policiais civis e militares do estado de São Paulo. A gente sabe
dessa relação e a dificuldade está aí", conta ele.
O Ministério Público de São
Paulo diz que tenta, junto com os promotores da Paraíba, prender os foragidos e
identificar quem daria proteção.
Depois das prisões realizadas
na operação Laços de Sangue, o medo de ser a próxima vítima não fica restrito
mais aos integrantes das duas famílias. No fórum de Catolé do Rocha se
concentra a maior parte dos processos contra as famílias Oliveira e Suassuna.
No local, existe todo um esquema de segurança para proteger os dois juízes da
cidade. Os policiais ficam armados inclusive com fuzil.
O juiz Fabrício Meira Macedo
conta: "Só mesmo com esse aparato de segurança para que a gente tenha a
tranquilidade necessária para se concentrar nos processos".
Os juízes estão fazendo um
mutirão para que os processos sejam julgados rapidamente.
"A gente tem que
desenvolver o nosso trabalho com imparcialidade, com independência e sem deixar
se intimidar", alega o juiz Antônio Eimar de Lima.
Às cinco horas da tarde, os
juízes deixam o fórum. Policiais de elite da Civil e da Militar se preparam
para fazer a escolta. Entre as autoridades que já foram ameaçadas, estão o
delegado que investigou o caso e a juíza da cidade de Patos, também na Paraíba,
Higyna Bezerra. Foi ela quem decretou as prisões de integrantes das duas
famílias.
O Fantástico acompanhou um dia
de trabalho dessa juíza. Higyna anda escoltada e sempre deixa uma arma pronta
para o uso. E não é só. "Foi necessário mandar blindar o carro, porque não
me sentia segura para andar mais em carro normal", conta a juíza.
A morte da juíza Higyna
Bezerra teria sido encomendada por R$ 100 mil, a mando da família Oliveira.
Quem denunciou foi um preso acusado de homicídio. A equipe do Fantástico foi
atrás dele em um presídio de segurança máxima. Segundo a polícia, Kléber do
Nascimento Neres, o Kléber Chocolate, é um pistoleiro. Ele confirma que
autoridades estão marcadas para morrer: "Os juízes correm risco de vida. E
muito. Porque eles entraram em uma guerra que não tem nada a ver com
eles".
Para a equipe do Fantástico,
Kléber Chocolate diz que não é pistoleiro e nunca matou ninguém, mas confirma
ter recebido várias propostas: "Já falaram que tem uma pessoa para matar e
paga R$ 20, R$ 30 mil. Oferecia pistola, carro, moto. Tem mais pessoas marcadas
para morrer. Essa guerra não acabou nem vai acabar".
"Isso não vai impedir de
agir, isso não vai me impedir de continuar à frente desse processo, buscando
justiça para as pessoas", garante a juíza Higyna Bezerra.
Só por uma questão de
segurança, os policiais estão escoltando a gente ate a saída da cidade. Até a
gente pegar a estrada. Procuramos os advogados dos Suassuna e dos Oliveira. Em
nota, o advogado de Humberto Suassuna, que é o chefe dessa família, diz que seu
cliente é um cidadão de bem e que nunca se envolveu em brigas desse tipo. Alega
também que Humberto estava armado no dia da prisão para sua defesa pessoal
porque tinha sofrido um atentando.
O advogado dos Oliveira também
mandou uma nota ao Fantástico. Diz que as irmãs Cleide e Nalva, apontadas como
chefes desse grupo, são inocentes e que não financiavam os assassinatos. O
advogado também diz que é falsa acusação de que elas encomendaram a morte de um
juiz.
"São pessoas que
realmente viviam exclusivamente dentro dessa guerra, mas agora foi dado um
basta", diz o delegado Cristiano Jacques.
Fonte: Uirauna.net
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